segunda-feira, 9 de maio de 2016

RIP Diego Querido.


Estrela esquisita (de Cacá, poeta brasilienses)


Lá na imensidão do céu,

havia uma estrela esquisita.

Não que lhe faltasse brilho

ou que não fosse bonita.


Ela até brilhava muito.

Talvez até por engano,

pois já havia morrido

havia milhões de anos.


A milhões de anos luz,

mesmo depois de apagada,

mesmo assim ela insistia

iluminando a estrada.


E eu, daqui da minha porta,

passava horas a vê-la.

- Como brilha, se está morta?

Vai entender as estrelas!

terça-feira, 27 de agosto de 2013


porto alegre, 22 de dezembro de 1987

à noite fui naquele sobradinho que fica do lado do coleginho, em assunção.
tinha um recém formado do instituto rio branco,  que leu a minha mão.
segundo ele, predominam o ético e o estético.
amores fragmentados, muita exigência, tendencia à solidão.
no máximo um filho.
irei traçando meu destino lenta mas firmemente,
de uma forma que as pessoas não entendem.
tipo de percepção muito refinada.
tendencia a intelectualizar cada vez mais.
enfim, mil elogios.
mas fiquei triste.
não queria a solidão.
    Rio, 17 de outubro de 1987

    Briga feia

    dar socos no tijolo da cozinha
    andar em círculos
    sentar no chão
    consumir litros de chá de camomila
    prá depois pedir: fica comigo.



sábado, 11 de fevereiro de 2012

Wislawa Szymborska

Antes das férias de verão comprei um livro chamado [poemas], de wislawa szymborska
Comprei porque gosto de poemas
Gosto de poemas porque eles funcionam como uma uti quando estou saturada/intoxicada de palavras mediocres
de senso comum
ou quando preciso traduzir a dor com palavras

Comprei o livro também porque a capa é maravilhosa,
uma senhora [wislawa] fumando, fumaça no rosto, café ou chá na frente.



Bastou ler um verso, ainda de pé na livraria, para sentir o impacto de uma poesia perfeita, cirúrgica, limpa.

Ao ler a poesia "Agadecimentos", uma revelação.
Pensei em todos os meus amigos.
Especialmente Átila e Shirley, que estavam deixando Brasília.
E a poesia traduziu, again, a felicidade do amor sem amor que sentimos pelos amigos.
É assim:

Devo muito
aos que não amo.

O alívio de aceitar
que sejam mais próximos de outrem.

A alegria de não ser eu
o lobo de suas ovelhas.

A paz que tenho com eles
e a liberdae com eles
isso o amor não pode dar
nem consegue tirar.

Não espero por eles
andando da janela à porta.
Paciente
quase como um relógio de sol,
entendo o que o amor não entende,
perdoo,
o que o amor nunca perdoaria.

Do encontro à carta
não se passa uma eternidade,
mas apenas alguns dias ou semanas.

As viagens com eles são sempre um sucesso,
os concertos são assistidos,
as catedrais visitadas,
as paisagens claras.

E quando nos separam
sete colinas e rios
são colinas e rios
bem conhecidos nos mapas.

É mérito deles
eu viver em três dimensões
num espaço sem lírica e sem retórica,
com um horizonte real porque móvel.

Eles próprios não veem
quanto carregam nas mãos vazias.

"Não lhes devo nada"-
diria o amor
sobre essa questão aberta.

Este mês Wislawa morreu, de câncer no pulmão, course.
Mas ela fará parte para sempre de minha vida, de Atila, de Shirley.
E também de Flávio Ghilardi e Renato Rezende, para quem li e com quem discuti, enquanto fazia uma colagem.

E de quem mais ler e gostar.

No momento, coração quebrado (again e again),  que Wislawa entre na minha veia e me ensine algo. O quê, não sei. O que não.


sábado, 13 de agosto de 2011

a dança

começou com rose porto alegre, numa loja fechada da alberto bins, perto do viaduto.
alguém tinha a chave.
a sala era iluminada por velas.
muita poeira e inspiração.
negra lú dançando e giba rocha fotografando.
depois foi a academia muDança, na independencia, fundos.
eva schull, mestre indio.
nikolais, marta graham, jazz e capoeira.
num verão no rio, vi gabriela figueiroa dançar.
mudei pro rio por ela.
algumas aulas depois me perdi na loucura da sobrevivencia na nova cidade (foi foda) e nao sei bem porque migrei para jerry maretzki e cheguei na mariana, linda mariana, que dava aulas no espaço novo de angel e rainer viana. mariana foi dançar no ballet municipal de sao paulo e eu fiquei com rainer muitos anos felizes.
(...)
a dança teve vários sentidos em minha vida.
quando sai de porto alegre, queria voltar para abrir na cidade uma academia de dança livre
(sempre tive sonhos heroicos).
depois dancei só para dançar a vida, coisas dos anos 80.
(...)
aos 51 anos, olhei pro espelho da sala, para a barra, para minha aparencia envelhecida e feliz.
desta vez não têm projetos nem festas. apenas a sensação anônima de estar de volta.

domingo, 19 de junho de 2011

a menina mais bonita da cidade

ana becker era a menina mais bonita da cidade.

e também era muito inteligente, muito sensível. 
sempre foi além de nós, as outras meninas da cidade. 

quando a conheceu, no bonfim, o caio fernando abreu disse que ela parecia uma fadinha. 


a primeira vez que a vi foi no menino deus, onde fazíamos educação física.
[era bem longe da nossa escola, na verdade. eu pegava dois ônibus para chegar. coisas de escola pública]

bem, lá estava eu, em 74, eu acho, quando vejo uma menina linda fazendo baliza.
não de carro! baliza era o que faziam as meninas lindas em frente às bandas de música das escolas.

aninha tinha vindo se santiago, e morava num prédio em frente ao colégio.
nós eramos as duas loiras, as duas usavam óculos redondos como janis joplin e as duas eram ripongas.
ficamos inseparáveis, por longos anos.

um dia chamaram meus pais no colégio: eu fora vista aos beijos no recreio com o hermenegildo
(um cara lindo, inteligente, apaixonado por john lennon e que desenhava muito bem).
claro que não era eu. era aninha quem ele estava beijado...

ela namorou o kiko e eu namorei o keko, irmão dele.
fizemos teatro juntas no grupo "almas e lamas".
e dançamos dançamos dançamos e dançamos juntas na academia mudança.

tomávamos litros de café e fumávamos camel.
eu usava  alfazema garrão, ela também.
ouvíamos roquenrrol.
lagarteávamos na praça da matriz.
escrevíamos diários.
conversávamos.
lemos vários livros de dostoiévski juntas.
viajamos de carona de porto alegre a natal, juntas.
choramos de amor juntas.

um dia aninha saiu pra conhecer o brasil com um namorado jornalista.
porto alegre ficou ainda mais cinza. fui embora pro rio.
depois ela voltou pro sul, depois foi morar na europa, depois voltou pro sul.
eu nunca mais voltei.

tiramos carteira na mesma época, eu em brasília, ela em porto alegre.
tivemos filhos no mesmo ano: eu mathias, ela isabel.

ana é casada com manuel, um fotógrafo perfeito, e mora perto da redenção.
eu sou solteira e moro perto do olhos d´ água.

tenho dezenas de cartas e fotos de ana.
este blog só existe porque ela existe.

hoje ela me ligou e eu pedi pra ela ler o blog.
então sentei aqui e tomei coragem de chegar nos anos 70, finalmente [se a ana deixar].